Cirurgião-dentista ou médico-orofacial: qual é o futuro de nossa profissão?

Cirurgião-dentista ou médico-orofacial: qual é o futuro de nossa profissão?

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Na coluna “Legislação”, Luciano Artioli faz uma importante reflexão sobre o futuro dos profissionais da Harmonização Orofacial.


Uma importante mudança no conceito de nossa profissão está sendo discutida, neste momento, na Câmara dos Deputados. Um projeto de lei (PL 4.405/2019), apresentado em 13 de agosto pelo deputado federal José Augusto Rosa – também conhecido como Capitão Augusto –, propõe a alteração da denominação “Odontologia” para “Medicina Orofacial” e de “cirurgião-dentista” para “médico-orofacial”.

Para quem observa de longe, poderia se tratar apenas de uma mudança superficial, sem maiores implicações. No entanto, sabemos que essa proposta tem muito a ver com a realidade que levou ao recente reconhecimento da Harmonização Orofacial como especialidade. Sob essa perspectiva, a mudança faz todo o sentido e seria muito bem-vinda, já que pontua claramente diante da população a abrangência e a área de atuação da nossa profissão, tanto na cavidade oral quanto na face.

Em nota recentemente divulgada pelo Conselho Federal de Odontologia (CFO), a autarquia se pronunciou decisivamente contra a alteração, isso antes de ter constituído a oportunidade de um amplo debate entre os profissionais do setor. Apesar de não concordar com o caráter “finalístico” do comunicado, deve-se presumir que o CFO tenha bons motivos para, nesse momento, ter se posicionado assim. No entanto, apesar da legitimidade da nossa autarquia federal, acredito que os cirurgiões-dentistas merecem a oportunidade de discutir esse assunto, e participar mais ativamente das decisões que, como essa, afetem diretamente a sua imagem perante a população e o seu futuro profissional.

É muito comum vermos órgãos governamentais realizarem consultas públicas antes de tomarem posição sobre vários temas. Nesse caso, no entanto, o ideal seria estabelecer debates em universidades e entidades representativas da categoria profissional, onde prós e contras possam ser esclarecidos e amadurecidos.

A posição do CFO foi divulgada dois dias após a publicação do projeto de lei. Ainda não superamos completamente os danos que a Odontologia, em especial a Harmonização Orofacial, sofreu nesses quase 10 anos lutando com outras categorias, muito por conta de uma Resolução publicada pelo CFO em 2011, de maneira autocrática.

Diante de um mundo que se transforma tão rápido, contamos com um novo e bem melhor CFO, com novos e ainda melhores CROs, novas realidades. Não devemos ficar abraçados ao passado, sob o risco de ficarmos para trás. No início, nosso ofício era realizado por “barbeiros”, mas nossa profissão evoluiu e, assim, surgiu o cirurgiãodentista. Da mesma forma, as “aeromoças” viraram “comissárias de bordo”, as “secretárias” passaram a ser “assistentes pessoais”, as pessoas passaram a ir em “salões de beleza”, não mais em “barbeiros” ou “cabeleireiros”. A transformação faz parte da evolução de cada categoria.

Olhando um pouco além de nossas fronteiras, podemos recordar o exemplo de Portugal, onde os termos “Medicina Dentária” e “médico-dentista” estão consagrados. Aqui mesmo, no Brasil, temos os exemplos dos “médicos veterinários” e dos “biomédicos”, cuja denominação marca claramente suas áreas de atuação. Por que “Odontologia” não poderia ser substituída por “Medicina Orofacial”, uma vez que, na opinião de muitos, a terminologia proposta informa mais claramente o nosso papel na saúde do paciente?

Por fim, independentemente das boas intenções, o projeto de lei tem poucas chances de emplacar, a menos que passe a contar com o apoio do CFO e de grande parte da categoria profissional, o que só poderá acontecer quando os cirurgiões-dentistas participarem desse debate. O tempo é curto. A proposta será analisada na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP) e, neste momento, está aguardando a designação do relator.

Está na hora de refletirmos e decidirmos o que queremos para as próximas décadas de nossa profissão. O futuro da Odontologia precisa ser construído por nós.

Confira todas as edições da coluna “Legislação”, de Luciano Artioli.

Luciano Artioli


Luciano Artioli Moreira
Presidente do Conselho Editorial da revista FACE.