Gel de plasma pobre em plaquetas (PPP) como preenchedor dérmico autólogo
Tubo com PPP e botão eritrocítico-plaquetário no fundo do tubo, após a segunda centrifugação.

Gel de plasma pobre em plaquetas (PPP) como preenchedor dérmico autólogo

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Lucila Largura mostra que o gel de PPP é um biomaterial promissor na área de engenharia de tecidos e regeneração tecidual.

O envelhecimento facial é um processo inevitável que provoca sinais impactantes na vida diária de milhões de pessoas. O aparecimento de rugas, o aumento da flacidez e a perda de volume facial, como a deformidade da calha lacrimal (Figuras 1A, 2A e 3A), são alguns dos sinais que frequentemente causam grande incômodo aos indivíduos.

Produtos e técnicas que podem amenizar ou retardar o processo de envelhecimento tiveram sua popularidade aumentada nos últimos anos, especialmente os preenchedores dérmicos e os bioestimuladores.

Materiais injetáveis sintéticos, como ácido hialurônico, hidroxiapatita de cálcio e ácido polilático, são capazes de restaurar o volume facial perdido com a idade, reduzir rugas e melhorar a espessura e a qualidade dérmica, devolvendo características faciais da juventude.

Embora esses materiais apresentem grandes vantagens, alguns fatores devem ser considerados, como a possibilidade de reações inflamatórias, imunológicas, oclusão vascular e necrose1. Recentemente, a terapia para rejuvenescimento e preenchimento facial através de derivados sanguíneos autólogos tem tido destaque, pois estes demonstraram capacidade de induzir a síntese de colágeno e outros componentes da matriz extracelular, além de serem atóxicos e não imunorreativos.

O hemoderivado mais popular na área antienvelhecimento é o plasma rico em plaquetas (PRP), que pode ser definido como um produto derivado do sangue total, caracterizado por elevadas concentrações de plaquetas, seus fatores de crescimento (FC) e proteínas em um pequeno volume de plasma2.

O PRP é obtido por centrifugação de uma pequena quantidade de sangue, que separa o plasma, os leucócitos e as plaquetas dos glóbulos vermelhos. A terapia com PRP avançou imensamente na prática clínica dos profissionais que trabalham na área da regeneração de tecidos e da saúde integrativa. Esse campo de pesquisa se concentrou principalmente nos fatores de crescimento de plaquetas, porém a arquitetura da fibrina e o conteúdo de leucócitos são também relevantes. O PPP é o plasma residual após a extração do PRP, que contém proteínas benéficas, insulina-GF (IGF) e baixo número de plaquetas3. Ele geralmente é descartado após a extração do PRP, porém alguns estudos sugerem que o gel de PPP pode ser usado como material preenchedor dérmico e auxiliar no rejuvenescimento facial. Assim, houve um recente aumento de seu uso na cirurgia odontológica, na cirurgia plástica, na cirurgia ortopédica e na medicina regenerativa4.

A ativação do PPP pela adição de um ativador de cascata de coagulação, como gluconato de cálcio, cloreto de cálcio ou trombina e/ou tratamento térmico, dá origem à formação de um material gelatinoso conhecido como “gel de plasma”5. O gel de plasma contém fibrina que fornece à fórmula maior consistência e resistência do que o PRP ou o PPP comum, e proteínas gelificadas que proporcionam estabilidade e volume constantes6.

O objetivo da ativação pela adição de gluconato de cálcio é promover rendimentos mais altos de liberação imediata, maciça e sustentada de fatores de crescimento7.

O processo de aquecimento induz a desnaturação das proteínas plasmáticas que mantêm a fórmula do gel, permitindo a injeção de uma quantidade precisa no local desejado8.

A morfologia ultraestrutural e os componentes do PRP e do PPP foram avaliados em estudos que demonstraram que a concentração de plaquetas e seus fatores de crescimento se apresentam maior no PRP do que no PPP, entretanto a concentração de fibrinogênio foi muito maior no PPP. Além disso, as fibras de fibrina tendem a se formar em feixes no PPP e não no PRP. Essa rede fibrosa de fibrina insolúvel fornece um andaime para plaquetas que serve como substrato para a liberação sustentada de FC. Esse andaime ajuda a localizar os FC, aumentando essencialmente a concentração no local desejado, atuando como guia para a regeneração tecidual9-10.

A fibrina é uma matriz proteica produzida a partir de fibrinogênio, que pode ser colhida autologicamente do paciente, fornecendo um transportador imunocompatível para a entrega de biomoléculas ativas, especialmente células.

Tanto a fibrina quanto o fibrinogênio têm aplicação bem estabelecida nas pesquisas em engenharia de tecidos, devido à sua capacidade inata de induzir a interação celular melhorada e a subsequente remodelação de andaimes em comparação com andaimes sintéticos11.

Preparação do gel de PPP

Aproximadamente 10 mL de sangue venoso devem ser coletados do paciente em um tubo de vácuo estéril contendo anticoagulante, geralmente o citrato de sódio.

Os tubos são centrifugados conforme protocolo escolhido pelo profissional dependendo de características de sua centrífuga, sendo que não há um consenso na literatura sobre esse protocolo.

O resultado da primeira centrifugação são três camadas distintas: camada inferior composta de glóbulos vermelhos, camada intermediária composta de células brancas (buffy coat) e camada superior composta de plasma (PRP e PPP). A camada plasmática é transferida para tubos secos, os quais passarão por uma segunda centrifugação, resultando na obtenção de duas partes de plasma em cada tubo: a parte inferior que consiste em PRP e a parte superior que consiste em PPP, além do botão eritrocítico-plaquetário que fica suspenso no fundo do tubo (Figura 4A).

Na sequência, 80% do PPP é suavemente aspirado para seringas de injeção estéreis de 3 mL e recebe a adição do ativador gluconato ou cloreto de cálcio na proporção de 0,01 mL por 1 mL de PPP. As seringas são aquecidas em uma incubadora que atinge 70°C, por um tempo que pode variar entre cinco e 15 minutos, dependendo da viscosidade desejada em diferentes regiões e planos faciais.

Em seguida, as seringas são resfriadas em um refrigerador com temperatura entre 8°C e 0°C por um minuto. Após esse processo, o PPP transformou-se em um gel viscoso e está pronto para o uso4 (Figura 4B).

Indicações clínicas

O gel de PPP autólogo pode ser empregado para a melhora da qualidade dérmica, correção estética de rugas faciais e restauração do volume facial, principalmente em deformidades na goteira lacrimal. Preenchimento do sulco nasolabial, preenchimento da face média e lábios também estão indicados. A técnica de injeção é a mesma empregada para a injeção de ácido hialurônico. Para o preenchimento de rugas cutâneas, recomenda-se aplicar o material no plano dérmico, e para restauração de volume, recomenda-se a aplicação em planos mais profundos, como tecido subcutâneo ou supraperiostal. Três aplicações com intervalos de um mês são indicadas, e mais sessões podem ser necessárias dependendo do grau de envelhecimento e reabsorção óssea. O resultado se mantém, em média, por três meses após a última aplicação4.

O PRP pode ser associado ao plasma gel de PPP no mesmo ato operatório, e assim aumentar a liberação de fatores de crescimento. Outra possibilidade é associar a injeção de gel de plasma pobre com a injeção de ácido hialurônico reticulado, pois o andaime biológico gerado pelo gel de plasma favorece a regeneração do tecido e a estabilidade do ácido hialurônico.

A injeção de gel de PPP como preenchimento dérmico apresenta um resultado volumétrico imediato e estável por três meses, em média, devido a sua fórmula em gel composta por feixes de fibras e proteínas gelificadas desnaturadas. O gel localiza as plaquetas ativadas e seus FC.

As plaquetas são aprisionadas no gel e permanecem liberando FC após a injeção, que promovem a neovascularização e a neocolagênese através da interação com fibroblastos dérmicos, resultando no aumento do tecido, na redução da profundidade das rugas, na melhora da textura, na elasticidade e na homogeneidade da pele12.

Um estudo avaliou a eficácia clínica e a segurança da injeção de gel de PPP como preenchimento dérmico para rejuvenescimento facial, e sugeriu que a liberação contínua de fatores de crescimento de plaquetas presas no local da injeção possa ser responsável pelos efeitos terapêuticos sustentados do gel de PPP por alguns meses após a última sessão de tratamento4.

Pode ocorrer também uma redução das manchas de pele. Essa melhora pigmentar pode ser devida ao aumento do volume da pele após a injeção de gel no plasma, além do efeito inibitório do fator de crescimento transformador (TGF)-β1 na melanogênese via ativação retardada da quinase regulada por sinal extracelular13-14.

A aplicação de gel de PPP é um procedimento não cirúrgico simples, de baixo custo e bem tolerado, que oferece máxima segurança ao paciente, já que é um biomaterial autólogo e isento de riscos de reações imunogênicas ou reações inflamatórias mais severas. O seu uso como preenchedor facial tem efeito volumétrico e redutor de rugas e sulcos. Sua atuação deve-se ao elevado nível de fibrinogênio presente no gel, capaz de formar feixes de fibrina que funcionam como andaime biológico para as plaquetas, as quais servem como substrato para liberação sustentada de FC.

O gel de PPP apresenta como desvantagem o curto período de duração do efeito de volumização, mas certamente é um biomaterial promissor na área de engenharia de tecidos e regeneração tecidual, e uma excelente alternativa terapêutica para preencher rugas e deficiências volumétricas na face (Figuras 1B, 2B e 3B).

Referências

  1. Requena L, Requena C, Christensen L, Zimmermann US, Kutzner H, Cerroni L. Adverse reactions to injectable soft tissue fi llers. J Am Acad Dermatol 2011;64(1):1-34.
  2. Banihashemi M, Nakhaeizadeh S. An introduction to application of platelet rich plasma (PRP) in skin rejuvenation. Rev Clin Med 2014;1(2):38-43.
  3. Bielecki T, Dohan Ehrenfest DM, Everts PA, Wiczkowski A. The role of leukocytes from L-PRP/L-PRF in wound healing and immune defence: new perspectives. Curr Pharm Biotechnol 2012;13(7):1153-62.
  4. Doghaim NN, El-Tatawy RA, Neinaa YME-H. Assessment of the effi cacy and safety of platelet poor plasma gel as autologous dermal filler for facial rejuvenation. J Cosmet Dermatol 2019;18:1271-9.
  5. Yang L, Ma J, Gan S et al. Platelet poor plasma gel combined with amnion improves the therapeutic effects of human umbilical cord-derived mesenchymal stem cells on wound healing in rats. Mol Med Rep 2017;16(3):3494-502.
  6. Moreno PG, Ortiz GA, Martinez LT, Barbero J, O’Valle F, Wang HL. Composition of platelet-rich plasma gel: a western blot analysis. J Oral Sci Rehabilit 2016;17(2):42-8.
  7. Kakudo N, Minakata T, Mitsui T, Kushida S, Notodihardjo FZ, Kusumoto K. Proliferation-promoting effect of platelet-rich plasma on human adipose–derived stem cells and human dermal fibroblasts. Plast Reconstr Surg 2008;122(5):1352-60.
  8. Woo SH, Kim JP, Park JJ, Chung PS, Lee SH, Jeong HS. Autologous platelet-poor plasma gel for injection laryngoplasty. Yonsei Med J 2013;54(6):1516-23.
  9. Hatakeyama I, Marukawa E, Takahashi Y, Omura K. Effects of platelet-poor plasma, platelet-rich plasma, and platelet-rich fibrin on healing of extraction sockets with buccal dehiscence in dogs. Tissue Eng Part A 2014;20(3-4):874-82.
  10. Sclafani AP. Safety, efficacy, and utility of platelet-rich fibrin matrix in facial plastic surgery. Arch Facial Plast Surg 2011;13(4):247-51.
  11. Malafaya PB, Silva GA, Reis RL. Natural-origin polymers as carriers and scaffolds for biomolecules and cell delivery in tissue engineering applications. Advanced Drug Delivery Reviews 2007;59:(4-5)207-33.
  12. Wasterlain AS, Braun HJ, Harris AH, Kim HJ, Dragoo JL. The systemic eff ects of platelet-rich plasma injection. Am J Sports Med 2013;41(1):186-93.
  13. Kim DS, Park SH, Park KC. Transforming growth factor-beta1 decreases melanin synthesis via delayed extracellular signal-regulated kinase activation. Int J Biochem Cell Biol 2004;36(8):1482-91.
  14. Çayırl M, Çalış kan E, Açıkgöz G, Erbil AH, Ertürk G. Regression of melasma with platelet-rich plasma treatment. Ann Dermatol 2014;26(3):401-2.